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Em uma perspectiva otimista para 2021, a advogada, doutora em direito público e pesquisadora do Centro de Regulação e Democracia do INSPER, Patrícia Valente, fala sobre o projeto de nova lei de compras públicas e a necessidade latente das reformas administrativa e fiscal no Brasil.

Valente ressalta o papel dos órgãos de controle no pós- pandemia da covid-19 e vê com bons olhos os projetos em aeroportos e rodovias, que estão atraindo a atenção de investidores internacionais.

ILDD: No que diz respeito à pauta de Infraestrutura no Brasil, qual dever ser o tema prioritário para 2021, na sua opinião, para a retomada da economia no pós-covid-19: saneamento, rodovias ou portos?

Patrícia Valente: Iniciaremos 2021 com a esperança de que a retomada econômica ocorra nos setores de infraestrutura, em razão da perspectiva de início da vacinação. Como o Brasil, tanto no plano federal quanto estadual, fez seu dever de casa durante 2020, há um pipeline bastante robusto de projetos a serem leiloados ao longo do ano. Se todos os projetos que estão sendo gestados saírem do papel, teremos muito trabalho pela frente!

Os projetos em aeroportos e rodovias dão continuidade ao trabalho que as administrações estaduais fizeram na área, bem como a administração federal. No âmbito federal, deve-se dar destaque à resposta rápida que a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) deu aos pleitos de reequilíbrio em que já foram tratados os efeitos dos desequilíbrios em razão da crise ao longo de 2020. São projetos em que investidores internacionais estão com os interesses voltados ao Brasil, uma vez que neste momento não há outros projetos disponíveis em outros países.

No setor de saneamento, o destaque vem definitivamente para os projetos que estão sob modelagem neste momento, já tendo como referência o novo marco legal. Tivemos leilões importantes já em 2020 (por exemplo em Alagoas), mas a grande aposta será nos leilões de áreas atualmente sob administração da CEDAE, que deverá atrair investidores já atuantes no país e outros. Acrescentaria ainda projetos em concessões e PPPs sociais como presídios, escolas e hospitais que, apesar de não serem de infraestrutura, se beneficiam do know-how que os gestores e especialistas adquiriram em infraestrutura. Em razão da crise e do esgotamento dos projetos de infraestrutura, as gestões estaduais já começam a olhar para esse novo nicho.

ILDD: Você acha possível que seja aprovado o projeto de nova lei de concessões ou de nova lei de compras públicas? Como você enxerga as possibilidades de avanço na pauta de privatizações?

Patrícia Valente: A pauta do Congresso Nacional foi bastante intensa em 2020. Houve o marco do saneamento, a aprovação da nova lei de licitações que ainda aguarda sanção, bem como discussões em andamento sobre debentures de infraestrutura, nova lei de concessões, PL das Ferrovias e BR do Mar, que prometem trazer discussões intensas para o setor nos próximos meses. Apesar de essas medidas trazerem (ou potencialmente trazerem) novidades para o setor de infraestrutura, identifico a reforma administrativa e a fiscal como iniciativas legislativas mais fundamentais neste momento.

Em pesquisa realizada no Centro de Regulação e Democracia do INSPER e em parceria com o JOTA, entrevistamos diversos atores que, de alguma forma atuam na infraestrutura dos transportes, dentre eles agentes reguladores, órgãos de controle, ministério, concessionárias, investidores, seguradoras, etc.

Baixar o PDF ou acessar o link do Jota: https://www.jota.info/tudo-sobre/pesquisa-jota-insper

Advogada, doutora em direito público e pesquisadora do Centro de Regulação e Democracia do INSPER

Quando perguntamos se alguma nova lei seria necessária para promover investimento em infraestrutura no Brasil não souberam apontar um PL específico. Assim, entendo que não havia uma necessidade latente (aqui excluo o setor de saneamento), e não significa que as iniciativas não trouxeram ou não trarão inovações que serão benéficas ao setor. As reformas administrativa e fiscal são mais estruturais para a construção do país que queremos ver no futuro.

Falando ainda apenas de infraestrutura, para atrair investimento privado, o país precisa garantir estabilidade e previsibilidade em temas como a simplificação da tributação e a organização administrativa dos servidores públicos.

Para o estrangeiro, o sistema tributário é muito complicado e o deixa refém de contadores e advogados, de maneira que não ocorre em outros países com perfil de investimento semelhante. Quanto à reforma administrativa, para o investidor, o servidor público é aquele que, no final do dia, faz a gestão dos contratos de concessão e PPP. Portanto, acaba sendo importante também.

ILDD: Ainda no que diz respeito ao enfrentamento das consequências da Covid-19, como os órgãos de controle estão funcionando, a seu ver, e como devem enfrentar o tema do reequilíbrio econômico dos contratos de concessão que foram fortemente impactados em 2020?

Patrícia Valente:  Desde a eclosão da Operação Lava Jato, os órgãos de controle assumiram um protagonismo sem igual. Competências antes exercidas com mais cautela e deferência ao papel das agências, passaram a ganhar cada vez mais espaço em temas que abrangeram contratos e normas relativas à infraestrutura. O TCU, por exemplo, tem se envolvido em definições importantes, não apenas na análise prévia dos editais e contratos de projetos a serem leiloados como também nos procedimentos de renovação antecipada de contratos de concessão, outro importante avanço ocorrido em 2020.

Prefiro analisar a questão do recrudescimento da atuação do controle redirecionando o olhar para as próprias agências. O que as agências podem fazer para evitar ou demonstrar aos órgãos de controle que suas decisões e atividades estão sendo bem executadas? Uma das possíveis respostas seria a partir de uma boa instrução processual, que reflita o processo de tomada de decisão (princípio da motivação) a partir de metodologia clara que compreenda ampla participação dos stakeholders setoriais e evidências para cada opção regulatória.

Nesse sentido ferramentas de qualidade regulatória já adotadas nos países podem ser úteis se aprimoradas, como a Análise de Impacto Regulatório e o sandbox regulatório.

ILDD: Marco Legal de Saneamento – Quais são os impactos do marco aprovado para a sociedade. Quais são as considerações a fazer sobre este tema?

Patrícia Valente: O novo Marco Legal do Saneamento tem como desafio de, nos próximos anos, revolucionar a percepção do usuário, especialmente sobre os serviços de esgoto. Os dados brasileiros são inadmissíveis em 2020 e, como resposta a isso, a Lei 14.026/2020 trouxe novas metas que serão obrigatórias não apenas para os contratos novos, mas também para os contratos antigos que tiverem metas menos rigorosas. Por exemplo, até 31 de dezembro de 2033, 99% da população deve ter água potável e 90% coleta e tratamento de esgoto.

Do ponto de vista regulatório, o novo marco do saneamento impôs à Agência Nacional de Águas – ANA uma missão que, se bem executada, poderá resolver pelo menos parte dos problemas de assimetria regulatória entre os Estados.

No Brasil, os serviços de saneamento são de competência local. Na prática, as agências reguladoras municipais ou estaduais acabam assumindo a função regulatória sem a capacidade institucional que as agências federais têm. Com a Lei 14.026/2020, a ANA assumiu a competência de produzir normas de referência, o que poderá guiar as agências locais na implementação das metas e boas práticas regulatórias para o setor.

ILDD: O que pode mudar nas concessões a partir de 2021?

Patrícia Valente: Como perspectivas para 2021, a infraestrutura precisará olhar para a infratechs, empresas de inovação com foco em algum setor de infraestrutura. Desde ferramentas que geram eficiência da gestão corporativa/administrativa até soluções sobre as atividades fins das concessionárias. Por exemplo, não serão mais admitidos índices de perda de água na distribuição acima do estabelecido pelo Ministérios do Desenvolvimento Regional para ter acesso a recursos federais. O mesmo deve ser considerado em outros setores como ferrovias, para acesso a informações sobre ocupação dos vagões, rodovias para verificação das demandas etc. Alguns setores têm investimentos obrigatórios em P&D como energia elétrica e O&G, mas outros ainda não. Isso deve mudar nos próximos anos com a inclusão da obrigação de investimentos em inovação.

Outro aspecto é quanto à ideia de impacto que cada contrato traz para a população atendida. A partir da necessidade de se adotar políticas de ESG, as concessionárias devem assumir como suas a missão de disseminar os benefícios que a concessão gera direta e indiretamente para a população atendida. É importante que o usuário veja valor no trabalho da concessionária e também retorno no pagamento da tarifa pela prestação dos serviços, passando a atuar a um só tempo como fiscal e defensor dos benefícios gerados pela concessão. Nas chamadas concessões comuns, como é mais comum em infraestrutura de transportes, os custos de um serviço concedido são arcados integralmente pelo usuário, o que significa dizer que pagam pelos serviços somente aqueles que efetivamente fazem uso dele, e não toda a população. Com isso, recursos públicos podem ser destinados a serviços cuja prestação é gratuita (saúde e educação) ou que não se mantêm somente com o pagamento de tarifas (conservação de florestas).

Patrícia Valente é sócia do Pessoa Valente Advogados. Pesquisadora do Centro de Regulação e Democracia do INSPER. LL.M., Mestre e Doutora em Direito Público.

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